A figura de Garrincha, o inesquecível ‘Anjo das Pernas Tortas’, transcende os campos de futebol e se entrelaça com o folclore brasileiro. Histórias pitorescas sobre sua ingenuidade e peculiaridades são constantemente revisitadas, mas nem sempre correspondem à realidade. Algumas dessas narrativas, perpetuadas ao longo dos anos, são postas à prova por pesquisadores e biógrafos.
Um exemplo clássico é a anedota do rádio comprado na Suécia durante a Copa de 1958. A lenda conta que Garrincha teria sido enganado ao acreditar que o aparelho só funcionaria em sueco. No entanto, essa história, popularizada pelo dentista da seleção Mário Trigo, parece não ter fundamento. Ruy Castro, em sua biografia “Estrela Solitária”, aponta que, na verdade, foi Garrincha quem pregou uma peça semelhante em um companheiro de Botafogo, Hélio ‘Boca de Caçapa’, durante uma viagem à Europa.
Outra crença popular é a de que Garrincha se referia a todos os seus marcadores como ‘João’ ou ‘Zé’, uma forma de despersonalizá-los e minimizar a importância da marcação. Narradores esportivos frequentemente usavam a expressão “É o último João do Maracanã” após mais um drible desconcertante. Contudo, Ruy Castro contesta essa versão, argumentando que não há evidências de que Mané realmente utilizasse esses apelidos.
Apesar da contestação de algumas lendas, a revista *Manchete* registrou uma declaração de Garrincha que oferece uma perspectiva interessante. “Para ele [Garrincha] todo mundo é ‘Zé’, o que quer dizer, Garrincha não acredita em ninguém”, afirmava a publicação, citando o próprio jogador: “Mas isso não é por desrespeito, não, é o meu modo de ser. Um homem da roça tem outra concepção de vida e de ponto de vista. Se eu tiver medo dos meus marcadores estarei perdido”. Essa fala revela uma faceta da sua personalidade: um homem simples, sim, mas estratégico e consciente de suas habilidades.
Finalmente, a narrativa de que Garrincha chamava qualquer time com camisas brancas de ‘São Cristóvão’, em referência ao time carioca, reforça a imagem de um homem com um olhar particular sobre o mundo. Essas histórias, verdadeiras ou não, contribuem para a rica tapeçaria que compõe a lenda de Garrincha, um ícone do futebol brasileiro cuja genialidade e peculiaridades continuam a encantar gerações.