A morte de Marcelo Rezende: um questionamento ao nosso jeito de conceber a fé em Deus

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 No último sábado o conhecido jornalista e apresentador Marcelo Rezende veio a falecer. Foi diagnosticado com câncer em maio desse ano, fato que ele fez questão de divulgar, sempre pedindo orações e apoio. Nos últimos tempos o apresentador em nome da fé em Deus, fez a escolha de abandonar o tratamento convencional de quimioterapia, para seguir tratamentos alternativos unidos à ajuda da fé. Em alguns momentos se manifestou, e isso ficou muito difundido pelas redes sociais, afirmando pela fé que Deus o curaria. Com altos e baixos esperava o momento receber cura de Deus. Essa decisão de Rezende questiona o jeito de compreendermos a fé. A fé pode nos autorizar a tomar uma decisão assim? Decidir abandonar o tratamento da medicina e esperar por Deus? Se todos os doentes em nome da fé decidissem fazer o mesmo?

                Poderíamos dizer que pessoalmente podemos fazer o que queremos. Apenas teremos que assumir as consequências de nossas escolhas. Outra coisa, seria agora dizer que essa decisão o colocou numa confiança total em Deus, nos últimos dias de sua vida e isso é bonito. Essas respostas são possíveis, mas não satisfazem uma mente desejosa de respostas mais objetivas e realistas. A religião deve unir fé e razão.

                Eu tenho convicção de que a fé que busca razões para o que crê, bem como, uma imagem adequada daquilo que Deus é e de como age, não me autoriza a fazer uma escolha assim, isto é, de abandonar o tratamento convencional e esperar só em Deus. Deus é força de cura? Com certeza é. Mas como? Deus está sempre agindo, no máximo de suas forças, para que a nossa vida esteja bem, que estejamos sãos e livres do mal. Ele está agindo em tudo aquilo que também nós fazemos para que a vida permaneça. Por isso, podemos dizer que todo o avanço da medicina é sustentado e apoiado por Deus. Onde o ser humano avança no cuidado com a vida, Deus está ali apoiando com todo seu amor. Não existe duas forças a agir no mundo. De um lado Deus e do outro lado o ser humano. Não é assim. Deus age dentro das ações humanas, apoiando a partir de dentro. Por isso, o bem que fazemos nasce, dá para dizer, do coração de Deus.

                Aplicando esse pensamento ao caso  do jornalista podemos dizer que a medicina e os benefícios que ela traz não é um bem paralelo aos bens que Deus traz. Não dá pra dizer: aqui age o ser humano e faz o bem e aqui age Deus e faz o bem. Não, a ação de Deus está dentro da ação do homem. Por isso, não valer-se do bem que a medicina traz se equivale a abandonar a ação de Deus. Um outro jornalista em algum momento disse: “Marcelo volta para o hospital e deixa Deus te ajudar”. É isso mesmo. Se tivesse permanecido com o tratamento de quimioterapia também não significa que teria ficado curado. Isso não dá pra saber. O que não podemos é autorizar a nossa fé a promover decisões desse tipo, pois dão a entender que Deus age por fora da ação humana. Precisamos confiar que Deus está agindo para nos dar vida. Mas ele está agindo dentro de  nossas ações. Por isso, diante de uma doença, por exemplo, confiemos com toda entrega na ação de Deus e busquemos o melhor que pudermos dos avanços da medicina e do apoio de quem amamos. Claro, mesmo assim poderemos morrer. Não porque existe a “hora da morte”, mas sim porque somos todos mortais e quando as forças que sustentam a vida de extinguem morreremos.

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